Não é do meu feitio copiar "textos inteiros" e postá-los aqui, mas hoje faço isso sem mudar "qualquer vírgula" no editorial desta sexta-feira, do jornal "O Estado de São Paulo".
Acho um texto de utilidade pública:
Excesso de zelo
Diante dos dados e estudos disponíveis sobre a gripe suína, só o excesso de zelo explica a decisão das autoridades de, numa tentativa de reduzir as possibilidades de transmissão da doença, adiar por duas semanas o início das aulas do segundo semestre na rede pública e recomendar às escolas particulares o mesmo procedimento. Só no setor público a medida atinge 6,5 milhões de estudantes de escolas estaduais e municipais da capital, de Campinas e Ribeirão Preto.
As escolas particulares não terão como deixar de aderir à medida, como já começaram a fazer. Se não agissem assim, certamente transmitiriam a impressão de que são menos zelosas do que os responsáveis pela rede pública com a saúde de seus alunos. Ou seja, mesmo que não estejam convencidos de que a medida é necessária, não têm como escapar a ela. Assim, a rede estadual de ensino só deverá retomar suas atividades dia 17 de agosto.
Ninguém coloca em dúvida a boa intenção das autoridades estaduais nesse caso. Mas os argumentos por elas usados não têm a força e a consistência necessárias para justificar uma medida dessa importância e dessa abrangência, que afeta a vida de milhões de pessoas. Segundo nota da Secretaria Estadual da Saúde, a decisão foi tomada "depois de análise das recomendações e avaliações da Organização Mundial da Saúde (OMS) a respeito da propagação do vírus entre estudantes e de recorrentes relatos sobre o aumento expressivo do número de crianças e adolescentes atendidos nos prontos-socorros paulistas por causa de problemas respiratórios".
Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que a OMS não recomendou o fechamento temporário de escolas em nenhuma cidade em que o vírus já se disseminou, como é o caso de São Paulo. Por isso, embora citando a OMS, a Secretaria teve o cuidado de não ligá-la diretamente à sua decisão. Na semana passada, como relata o correspondente do Estado, Jamil Chade, a OMS admitiu que o maior número de casos de gripe suína foi registrado, inicialmente, entre pessoas com idade de 12 a 17 anos, mas que a média de idade subiu com a expansão da doença. Daí porque o fechamento de escolas deixou de ser recomendável. Acrescente-se que o Ministério da Saúde sugeriu apenas que estudantes com gripe ou sintomas da doença fiquem em casa, o que é sensato.
As razões apresentadas pelo secretário estadual de Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata, também não são convincentes. "Consideramos que o inverno está forte e chuvoso", disse ele, "e isso tem feito com que aumente a concentração de pessoas em ambientes fechados. A esperança é que, com a chegada do calor, a partir de 15 de agosto, diminua o número de casos, mas ela (a gripe) não vai se interromper." Sua esperança não parece ter grande fundamento e, por isso, não deveria ser levada em conta para a adoção de medida tão dura. Afinal, da mesma maneira que o inverno está sendo rigoroso e sobretudo chuvoso, o calor poderá voltar bem depois de 15 de agosto.Se isso ocorrer, o que não é improvável, a medida poderá produzir efeito contrário ao desejado, supondo-se que o frio e a chuva, como creem o secretário e muitas outras autoridades e especialistas da área da saúde, favoreçam a disseminação do vírus. Ou seja, o número de casos de gripe pode aumentar durante as duas semanas de recesso escolar e a situação estar pior quando da volta às aulas.
É compreensível que as autoridades de saúde de São Paulo tentem fazer de tudo para evitar a propagação da gripe suína, que assusta a população. É sem dúvida preocupante o fato de essa pandemia ter se espalhado pelo mundo com uma rapidez bem maior do que a que normalmente se verifica nesses casos, o que explica a dificuldade demonstrada pela OMS de coordenar os esforços para tratar do problema. Mas, ao mesmo tempo, é preciso não esquecer que a taxa de letalidade da gripe suína é praticamente idêntica à da gripe comum.
Esse quadro sugere que é preciso agir com serenidade, o que exclui ações drásticas que não têm, até o momento, nada que as justifique, a não ser o excesso de zelo, que deve ser evitado.
Texto publicado no editorial do jornal O Estado de São Paulo - 31 de julho de 2009
Acho um texto de utilidade pública:
Excesso de zelo
Diante dos dados e estudos disponíveis sobre a gripe suína, só o excesso de zelo explica a decisão das autoridades de, numa tentativa de reduzir as possibilidades de transmissão da doença, adiar por duas semanas o início das aulas do segundo semestre na rede pública e recomendar às escolas particulares o mesmo procedimento. Só no setor público a medida atinge 6,5 milhões de estudantes de escolas estaduais e municipais da capital, de Campinas e Ribeirão Preto.
As escolas particulares não terão como deixar de aderir à medida, como já começaram a fazer. Se não agissem assim, certamente transmitiriam a impressão de que são menos zelosas do que os responsáveis pela rede pública com a saúde de seus alunos. Ou seja, mesmo que não estejam convencidos de que a medida é necessária, não têm como escapar a ela. Assim, a rede estadual de ensino só deverá retomar suas atividades dia 17 de agosto.
Ninguém coloca em dúvida a boa intenção das autoridades estaduais nesse caso. Mas os argumentos por elas usados não têm a força e a consistência necessárias para justificar uma medida dessa importância e dessa abrangência, que afeta a vida de milhões de pessoas. Segundo nota da Secretaria Estadual da Saúde, a decisão foi tomada "depois de análise das recomendações e avaliações da Organização Mundial da Saúde (OMS) a respeito da propagação do vírus entre estudantes e de recorrentes relatos sobre o aumento expressivo do número de crianças e adolescentes atendidos nos prontos-socorros paulistas por causa de problemas respiratórios".
Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que a OMS não recomendou o fechamento temporário de escolas em nenhuma cidade em que o vírus já se disseminou, como é o caso de São Paulo. Por isso, embora citando a OMS, a Secretaria teve o cuidado de não ligá-la diretamente à sua decisão. Na semana passada, como relata o correspondente do Estado, Jamil Chade, a OMS admitiu que o maior número de casos de gripe suína foi registrado, inicialmente, entre pessoas com idade de 12 a 17 anos, mas que a média de idade subiu com a expansão da doença. Daí porque o fechamento de escolas deixou de ser recomendável. Acrescente-se que o Ministério da Saúde sugeriu apenas que estudantes com gripe ou sintomas da doença fiquem em casa, o que é sensato.
As razões apresentadas pelo secretário estadual de Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata, também não são convincentes. "Consideramos que o inverno está forte e chuvoso", disse ele, "e isso tem feito com que aumente a concentração de pessoas em ambientes fechados. A esperança é que, com a chegada do calor, a partir de 15 de agosto, diminua o número de casos, mas ela (a gripe) não vai se interromper." Sua esperança não parece ter grande fundamento e, por isso, não deveria ser levada em conta para a adoção de medida tão dura. Afinal, da mesma maneira que o inverno está sendo rigoroso e sobretudo chuvoso, o calor poderá voltar bem depois de 15 de agosto.Se isso ocorrer, o que não é improvável, a medida poderá produzir efeito contrário ao desejado, supondo-se que o frio e a chuva, como creem o secretário e muitas outras autoridades e especialistas da área da saúde, favoreçam a disseminação do vírus. Ou seja, o número de casos de gripe pode aumentar durante as duas semanas de recesso escolar e a situação estar pior quando da volta às aulas.
É compreensível que as autoridades de saúde de São Paulo tentem fazer de tudo para evitar a propagação da gripe suína, que assusta a população. É sem dúvida preocupante o fato de essa pandemia ter se espalhado pelo mundo com uma rapidez bem maior do que a que normalmente se verifica nesses casos, o que explica a dificuldade demonstrada pela OMS de coordenar os esforços para tratar do problema. Mas, ao mesmo tempo, é preciso não esquecer que a taxa de letalidade da gripe suína é praticamente idêntica à da gripe comum.
Esse quadro sugere que é preciso agir com serenidade, o que exclui ações drásticas que não têm, até o momento, nada que as justifique, a não ser o excesso de zelo, que deve ser evitado.
Texto publicado no editorial do jornal O Estado de São Paulo - 31 de julho de 2009
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